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Chacina no Conde: decisão que mandou soltar policiais militares cita impossibilidade de reconstituir crime e testemunha não localizada


3º episódio da série 'Ele Tinha Envolvimento' mostra ação da PM que matou 5 jovens na PB

A decisão da Vara Única do Conde que determinou a soltura dos cinco policiais militares suspeitos de chacina no município do Conde, que terminou na morte de cinco jovens em fevereiro deste ano, cita a impossibilidade de reconstituir o crime e de localizar uma testemunha ocular citada nos depoimentos. Um sexto policial suspeito do crime, que está foragido nos Estados Unidos, teve a prisão convertida em preventiva.

Ao todo, seis policiais militares são suspeitos de homicídio e fraude processual em uma ação no dia 15 de fevereiro que terminou com a morte de cinco jovens, que, segundo a PM, planejavam vingar um feminicídio no Conde. Em determinação anterior, a defesa investigados afirmou que eles são inocentes. Os policiais militares investigados são:

Soldado Mikhaelson Shankley Ferreira Maciel

Sargento Marcos Alberto de Sá Monteiro

Sargento Wellyson Luiz de Paula

Sargento Kobosque Imperiano Pontes

Cabo Edvaldo Monteval Alves Marques

Tenente Álex William de Lira Oliveira (foragido)

Durante a prisão dos policiais, a Delegacia de Repressão ao Crime Organizado (DRACO) tentou localizar uma testemunha ocular mencionada em depoimento, mas não conseguiu. A Justiça também havia determinado a reconstituição do crime, mas os policiais investigados optaram por exercer o direito ao silêncio e, por meio da defesa, afirmaram que não participariam da ação.

O setor pericial concluiu que seria tecnicamente impossível realizar a reprodução simulada do crime sem a participação dos policiais militares. Com isso, os principais fundamentos da prisão temporária ficaram inviabilizados e a juíza destacou que diante desses fatos não seria possível prolongar a prisão dos investigados.

"Não se pode admitir que a restrição da liberdade se prolongue indefinidamente na expectativa de localização de uma testemunha não identificada ou de diligências que foram expressamente recusadas pelos investigados, inviabilizando sua execução", afirmou a decisão.

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A defesa dos policiais também pediu a revogação das prisões, argumentando que não havia mais finalidade na medida. O Ministério Público também reconheceu a perda de utilidade da prisão temporária e concordou com a substituição por medidas cautelares, além de defender a prisão preventiva do policial foragido.

Ainda segundo a decisão, as investigações continuam com outras diligências, como a análise de celulares e novos depoimentos de testemunhas que se sentiram encorajadas a falar durante a prisão dos policiais. A Justiça considerou, no entanto, que esses elementos não justificariam a manutenção da prisão temporária.

O Tenente Álex William de Lira Oliveira foi alvo do mandado de prisão preventiva durante a operação, no dia 18 de agosto, mas não foi localizado e segue foragido nos Estados Unidos. A defesa alegou inicialmente que ele estava de férias nos Estados Unidos e depois justificou a permanência nos Estados Unidos devido à gravidez de alto risco da esposa. Diferente dos outros cinco policiais, na decisão desta terça-feira (9), foi decretada a prisão preventiva dele.

A Justiça entendeu que o policial permaneceu fora do país mesmo após a decretação da prisão, caracterizando fuga do processo. Apesar dos laudos médicos da gravidez apresentados, foi atendido o pedido do Ministério Público para converter a prisão temporária em preventiva.

Policiais militares vão cumprir medidas cautelares

Os policiais foram soltos, mas a Justiça determinou as seguintes medidas cautelares:

Uso de tornozeleira eletrônica;

Afastamento imediato do serviço operacional (policiamento ostensivo ou tático);

Proibição de manter contato com familiares das vítimas, testemunhas e demais investigados;

Proibição de frequentar localidades próximas às residências das vítimas e seus familiares, complementando a medida de monitoração eletrônica;

Recolhimento domiciliar no período noturno, das 20h às 5h do dia seguinte, e nos dias de folga;

Comparecimento mensal em juízo;

Proibição de se ausentar da comarca de suas residências por mais de 10 dias sem autorização da justiça.

Eles devem ser liberados da carceragem do 1º Batalhão da Polícia Militar nesta quarta-feira (10).

Tiros nos carros, falta de perícia e provas retiradas do local

Carro ficou cheio de marcas de tiros após ação da PM paraibana

Polícia Militar da Paraíba/Divulgação

Durante a investigação do caso, os policiais afirmaram ter recebido a informação de que o filho de uma vítima de feminicídio estava indo vingar a morte da mãe em Mituaçu, no Conde.

Em seguida, os policiais montaram uma operação na Ponte dos Arcos, entre João Pessoa e Conde. Dois veículos se aproximaram, receberam ordem de parada, mas não obedeceram. Ainda segundo os policiais, foram ouvidos disparos vindos dos veículos, e todos os PMs revidaram atirando contra os carros.

Um laudo pericial apontou que os dois carros em que os jovens estavam foram atingidos por mais de 90 tiros: 74 disparos em um veículo e 18 no outro. O documento que solicitou a prisão temporária dos policiais registra que todos os disparos partiram de fora para dentro dos carros.

Ainda segundo a investigação, três armas foram supostamente apreendidas com os jovens, sendo que apenas duas estavam aptas para disparo e continham seis cartuchos já deflagrados. O documento ressalta, porém, que não é possível afirmar se houve disparos de dentro para fora dos veículos.

“Sem perícia no local do incidente, tampouco análise de fragmentos de vidro no solo, possíveis elementos balísticos e outros vestígios externos, não é possível afirmar com certeza absoluta que não houve disparos de dentro para fora, apenas se constatou não haver indícios inequívocos desse tipo de tiro no veículo, dadas as limitações acima”, registra o documento.

Uma testemunha relatou ter visto os policiais militares usando máscaras e recolhendo cápsulas espalhadas pelo local do crime.

Outra pessoa ouvida afirmou que uma testemunha ocular, ainda não identificada, presenciou a abordagem policial. Segundo esse relato, dois jovens estavam fora do carro com as mãos na cabeça, um permanecia dentro do veículo e outros dois estavam no chão, com os rostos encostados ao solo, enquanto policiais apoiavam os pés em seus pescoços. A mesma testemunha também teria ouvido o barulho de diversos disparos.

Uma testemunha também registrou que um parente de um dos jovens mortos relatou que ele planejava vingar o assassinato da mãe do amigo, que havia pedido apoio para o crime. A testemunha afirmou ainda que o jovem teria ligação com uma facção criminosa e possuía uma arma de fogo.

Relembre o caso

Cinco jovens morreram durante ação policial em João Pessoa

Reprodução/TV Cabo Branco

O caso que resultou na operação desta do dia 18 de agosto, aconteceu na noite do dia 15 de fevereiro de 2025. Segundo a Polícia Militar, os cinco jovens, com idades entre 17 e 26 anos, estavam se preparando para fazer um ataque no Conde, para vingar um feminicídio cometido horas antes.

Na mesma data, uma mulher havia sido morta por ter encorajado uma amiga, vítima de violência, a se separar do marido. O homem, com raiva, matou a mulher como vingança.

Então, de acordo com a PM, o filho da vítima reuniu amigos para vingar o assassinato. O veículo foi interceptado por viaturas da Polícia Militar e ao chegar na Ponte do Arco, o carro foi atingido por vários tiros, o que resultou nas mortes de todos os ocupantes. As vítimas foram identificadas como:

Fábio Pereira da Silva Filho, de 26 anos

Emerson Almeida de Oliveira, de 25 anos

Alexandre Bernardo de Brito, de 17 anos

Cristiano Lucas, de 17 anos

Gabriel Cassiano de Sousa, de 17 anos (filho de Ana Gabriela, vítima do feminicídio)

Os familiares dos jovens contestam a versão apresentada pela Polícia Militar, de que os jovens entraram em confronto com os agentes e, até, que as vítimas eram envolvidas com criminalidade.

Justiça mantém prisão de 5 PMs investigados por mortes de jovens no Conde (PB)

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