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Como o hip-hop fortalece autoestima e aproxima jovens periféricos da cultura na região de Campinas


Hip-hop aproxima jovens periféricos da cultura na região de Campinas

Na região de Campinas (SP), o hip-hop é visto como uma ferramenta de fortalecimento da autoestima e aproximação dos jovens periféricos à cultura. Segundo ativistas e uma especialista, o movimento une experiências de resistência negra e cria espaços de expressão e pertencimento.

A pesquisa “Vozes Campineiras”, realizada pela Fundação Feac e pela Quaest Pesquisa e Consultoria, identificou que o acesso à cultura e ao lazer é um dos principais desafios para a população campineira, especialmente nas periferias.

Apenas 27% dos moradores consideram fácil o acesso a atividades culturais e de lazer.

A maior concentração de ações culturais está no Centro, percebida por 81% dos moradores como a região com mais opções.

A falta de lazer foi citada como um dos serviços mais inacessíveis na cidade, junto com saúde e transporte.

Apesar disso, 74% dos campineiros gostam muito do bairro onde vivem.

A pesquisa também destacou que a vizinhança é a principal rede de apoio (85%), seguida por organizações da sociedade civil e igrejas.

É nesse cenário que o gênero atua como porta de acesso à cultura para os jovens da periferia. Em 2023, Campinas figurou em quarto lugar em um ranking nacional de consumo de rap de uma plataforma de streaming, mostrando o alcance e a influência do movimento na cidade.

Ele vai se transformar no movimento social e cultural das periferias justamente para narrar e resistir a essas realidades de desigualdade, ao mesmo tempo que foi fortalecendo a identidade identidade periférica, articulando música, dança, arte, moda e várias expressões culturais que surgem também do próprio movimento hip-hop.

Para Vieira, o hip-hop pode ser considerado um “laboratório de cidadania”, “onde se aprende sobre vários temas, mas especialmente sobre solidariedade, resistência e autoestima, que são valores fundamentais para uma educação cultural política”.

"Quando se rima sobre essa desigualdade, mas também sobre o pertencimento, esses jovens estão reescrevendo a sua experiência nessa história mais geral do Brasil, porque por muitos anos a nossa experiência marginal foi sendo cada vez mais apagada do registro oficial", analisa.

Brunnin, MC da Batalha do Cálice, batalhando com Guri

Fernanda Esposito

A cultura vive

Ruas, MC e produtor cultural, nasceu em Sumaré (SP), onde passou parte da infância. Na adolescência, viveu mais tempo em Hortolândia (SP). Ele conta que foi nesses ambientes que conheceu o hip-hop e se reconheceu como parte de um coletivo maior.

"Acho que isso foi o primeiro ponto que fez eu me identificar, assim, e fez eu saber do que se tratava, tá ligado? De ter esse apelo e de ter essa voz para a periferia, para as pessoas mais oprimidas ali de certa forma", diz o MC.

Para Ruas, o hip-hop vai além da música e funciona como um portal para diversas formas de expressão e conhecimento. “Quando você ouve um rap, por exemplo, você tem acesso a diversas outras coisas. Ele te conecta com moda, com filme, com audiovisual, sabe?”.

Ruas destaca que o hip-hip contribuiu para desenvolver o próprio pensamento crítico diante das situações do dia a dia e funcionou como um movimento de acolhimento e compartilhamento de experiências.

“Eu acho que ele ensina muita gente e traz muita autoestima para muitas pessoas através disso. E entender que é um espaço para todo mundo, né, mano? É um movimento que todo mundo pode e deve fazer parte", afirma.

Ruas MC se apresenta ao lado de DJ Tresk, em Campinas

Isabelly Godoy/g1

'Onde entendi que não sou menos que ninguém'

Esse processo de conscientização é compartilhado por Derek, dançarino e ativista cultural de Campinas, que teve o primeiro contato com o hip-hop pela dança. Para ele, o hip-hop foi essencial para compreender a identidade racial e social.

“Porque assim como muitos jovens negros como eu, a gente passa por esse processo de perceber que somos vistos de forma diferente pela sociedade. E o hip-hop foi o lugar onde eu entendi que eu não sou menos que ninguém por conta disso", comenta o dançarino.

Derek afirma que a identificação com as letras e histórias das músicas é profunda. “Muitas vezes a gente se apega muito na música, não só porque a batida é boa, mas porque a história daquela música a gente consegue olhar e falar: sou eu ali, tá ligado?”, diz.

Derek, dançarino e ativista cultural de Campinas, teve primeiro contato com o hip-hop pela dança

Arquivo Pessoal

Ser hip-hop

O sentimento de pertencimento é reforçado por Brunnin, MC da Batalha do Cálice. Nascido em Brasília (DF), cresceu na Bahia e mora em Campinas há oito anos. O MC acredita que ser hip-hop é viver a cultura com responsabilidade e consciência.

“É uma cultura muito ampla, tá ligado? Então não se prende em apenas um nicho, mano. Seja o hip-hop de verdade. Se você quiser ser hip-hop, seja o hip-hop no seu bairro, na sua quebrada, antes de ser no Brasil inteiro”, incentiva.

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Brunnin destaca que o hip-hop inclui vertentes como DJ, breakdance, grafite e moda streetwear, indo além das batalhas de rima. Mesmo diante de preconceitos e exclusão, o MC acredita que o hip-hop deve ser praticado com verdade e responsabilidade.

“Se ele é um mestre de cerimônia, que vai movimentar as pessoas, ele tem que saber o preço do que ele fala. Tem que ter uma responsabilidade social, sim, porque como eu disse, é inspiração, e inspiração pode ser por modo ruim ou bom também", pontua.

*Estagiária sob supervisão de Gabriella Ramos.

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