
     Capivaras ficam presas em lixo do Rio Pinheiros quase todos os dias
Sacolas plásticas, fitas, cordas, mochilas, bolsas e até calcinhas e sutiãs. Objetos assim ficam presos quase diariamente nas dezenas de capivaras que vivem às margens dos 25 km do Rio Pinheiros, na cidade de São Paulo.
A cena que chocou um ciclista no último sábado (25) — quando uma capivara foi vista com uma sacola plástica enrolada no pescoço, perto da estação Granja Julieta, na Zona Sul — está longe de ser isolada.
Casos como esse parecem raros, mas acontecem quase todos os dias, afirma Mariana Aidar, presidente da ONG Projeto CAPA (Centro de Apoio e Proteção Animal), que monitora a fauna silvestre ao longo do rio. Atualmente, cerca de 120 capivaras vivem no local.
Segundo ela, o acúmulo de lixo nas margens e dentro do rio tem impacto direto no bem-estar dos animais. O problema também ocorre com as mais de 60 espécies que habitam a região — aves terrestres e aquáticas, saruês, preás, lagartos e até tartarugas.
Capivaras sofrem com lixo às margens do Rio Pinheiros
Montagem/g1/Projeto CAPA/Isly Viana
Fitas rígidas são o maior risco
Apesar de comum, a sacola plástica é o item que menos preocupa os biólogos. “É mais fácil de retirar ou, às vezes, quando a gente chega para tirar, já caiu”, explica Mariana. Como as capivaras nadam e esbarram em detritos no fundo do rio, o plástico costuma rasgar.
O maior perigo é outro: fitas de polietileno usadas em lojas de construção e fábricas para amarrar materiais, como pisos. “É uma fita rígida, bem dura. Entra pela cabeça ou pelas patinhas e para no dorso. A capivara vai crescendo e aquilo não arrebenta por nada nesse mundo. Começa a rasgar o animal inteirinho.”
A ONG já retirou uma lista de objetos inusitados dos animais. “Sutiã, calcinha, cueca, biquíni, boné, bolsa, mochila. Ontem mesmo encontramos uma com uma mochila presa no corpo. É surreal. Muitas fitas, muitos tipos de corda e, principalmente, essa fita de polietileno.”
Após períodos de chuva, a quantidade de detritos aumenta. Mas, segundo a presidente da ONG, o descarte irregular ocorre independentemente do clima. “Tem dias que fica uma semana sem chover e a gente pega um monte de capivara com sujeira no corpo.”
As fitas de polietileno são as maiores vilãs
Projeto CAPA
População deve evitar contato
A ONG alerta que a população não deve tentar retirar objetos dos animais. Além de configurar crime ambiental, a prática coloca as pessoas em risco e atrapalha o trabalho de resgate.
Vamos supor que não seja uma sacola plástica. Se for algo realmente preso ao corpo, que a gente precisa interferir, a pessoa acaba deixando o animal mais arisco e isso prejudica muito o nosso trabalho. A gente sabe que é por boa intenção, mas atrapalha.
Segundo a presidente da ONG, as capivaras podem atacar em situações de estresse. Por isso, ao ver uma capivara ou outro animal silvestre machucado, a recomendação é procurar o Projeto CAPA.
Cerca de 120 capivaras são monitoradas pelo Projeto Capa
Reprodução/Projeto CAPA
Monitoramento diário e resgates
O Projeto CAPA atua com uma equipe de dez voluntários — biólogas, veterinárias e auxiliares de campo. Eles percorrem diariamente os 25 km do Rio Pinheiros para monitorar os animais e realizar resgates quando necessário.
“Normalmente, a gente consegue tratar no local e soltar imediatamente. Os ferimentos são diversos: lixo, atropelamentos dentro da ciclovia e até na marginal”, relata Mariana. Segundo ela, aves também sofrem com o acúmulo de resíduos: “Prende no bico e elas não conseguem se alimentar.”
Quando algum animal precisa de internação, a ONG o encaminha ao Centro de Manejo e Conservação de Fauna Silvestre de São Paulo (CeMaCAS), da prefeitura, onde pode passar por cirurgias e tratamentos mais complexos.
Garça-moura ficou dias com pano preso no bico
Projeto CAPA
Atropelamentos e ‘controle natural’
A população de capivaras é territorialista e gira em torno de 120 indivíduos. O CAPA deve iniciar uma nova contagem na próxima semana para avaliar se será necessário um programa de esterilização — algo que, segundo Mariana, parece improvável no momento.
Hoje, diz ela, já há um “controle natural” da população, causado principalmente por atropelamentos na marginal e até dentro da ciclovia e do parque. Para reduzir o risco, o CAPA conseguiu fechar 90% das saídas que ligam o rio à marginal, todas com doações.
Procurados para se manifestarem sobre a situação, o governo do estado e a Prefeitura de São Paulo não haviam dado retorno até a última atualização da reportagem.
Qualidade da água do Rio Pinheiros
O Rio Pinheiros é alimentado por vários rios menores ao longo dos 25 quilômetros de extensão. Ou seja, ele depende da qualidade da água que chega de cada um desses pequenos afluentes.
Apesar dos avanços dos últimos anos – como o cheiro que melhorou – a qualidade da água do Rio Pinheiros é classificada como péssima, segundo o relatório "O retrato da qualidade da água nas bacias hidrográficas da Mata Atlântica" divulgado em março desde ano.
Produzido pela Fundação SOS Mata Atlântica, o documento reúne dados de 112 rios entre janeiro e dezembro de 2024.
Na análise da fundação, rios são classificados com qualidade péssima quando a poluição atinge níveis críticos, prejudicando tanto a biodiversidade quanto a população que depende desses recursos hídricos e a saúde pública.
Vista do Rio Pinheiros, na zona oeste da capital paulista, que apresenta coloração verde nesta quarta-feira, 25 de setembro de 2024.
LECO VIANA/THENEWS2/ESTADÃO CONTEÚDO


 
				
                                 
			
                         
             
             
             
             
             
            