Das famosas onças às espécies de menor porte, como o discreto gato-do-mato, 12 espécies de felinos vivem no Brasil. Algumas são conhecidas do grande público, enquanto outras só foram descritas recentemente pela ciência.
Apesar das diferenças de tamanho, cor e comportamento, todas compartilham um destino comum: a convivência com um ambiente cada vez mais alterado pela ação humana. Entre atropelamentos, perda de habitat e mudanças no clima, esses animais vêm enfrentando desafios para sobreviver em florestas, campos e cerrados.
Nesta reportagem, o Terra da Gente reúne as principais informações sobre cada uma dessas espécies, destacando pesquisas recentes, peculiaridades biológicas e o papel fundamental desses predadores na natureza.
A pesquisa reúne dados do portal do Instituto Pró-Carnívoros e também contribuições do pesquisador Yan Rodrigues, biólogo responsável pelo Programa Carnívoros do Rio de Janeiro.
Onça-pintada (Panthera onca)
Onça-pintada (Panthera onca)
fuzzygoat / iNaturalist
Maior felino das Américas, a onça-pintada pode pesar até 135 kg e vive tanto em florestas quanto em áreas alagadas como o Pantanal. Além da força muscular impressionante, é conhecida pelo esturro e pela mordida mais potente entre os felinos.
Sua pelagem tem fundo amarelo-dourado com rosetas pretas, mas também há indivíduos melânicos (pretos). Exerce papel ecológico essencial como predador de topo, controlando populações de outros animais. Alimenta-se de presas como capivaras, veados, queixadas e até jacarés.
Em ambientes alagados, como a Amazônia, pode passar semanas vivendo sobre árvores durante as cheias. No Brasil, as populações vêm sendo severamente reduzidas, principalmente pela destruição de habitat e pela caça em retaliação a ataques ao gado.
Onça-parda (Puma concolor)
Onça-parda (Puma concolor)
Brendan Murtha / iNaturalist
Também conhecida como suçuarana, é o segundo maior felino das Américas e extremamente adaptável. Vai do Canadá ao sul da Argentina, vivendo em desertos, florestas tropicais e serras. No Brasil, é encontrada em praticamente todos os biomas, embora em densidades variáveis. Tem corpo esguio e coloração castanho-avermelhada, sendo capaz de saltar mais de 5 metros na vertical.
Apesar de ser descrita como noturna em muitos lugares, na Mata Atlântica mostra padrão de atividade catemeral - ou seja, ativa tanto de dia quanto à noite. “A vocalização da onça parda é semelhante a um miado, ela não urra ou esturra como a maioria dos grandes felinos, como a onça pintada”, comenta o especialista.
Alimenta-se de presas menores do que sua “parente” pintada, especialmente quando ambas coexistem. A perda de habitat e a redução de presas silvestres são suas maiores ameaças. É classificada como “Vulnerável” no Brasil.
Jaguatirica (Leopardus pardalis)
Jaguatirica (Leopardus pardalis)
moodejo / iNaturalist
De porte médio, a jaguatirica tem uma das pelagens mais belas do reino animal. Suas rosetas e listras pretas formam padrões únicos em cada indivíduo. É o felino silvestre mais amplamente distribuído nas Américas, presente desde o México até o sul do Brasil. Vive em florestas, campos e regiões alagadas, sempre com densa cobertura vegetal.
Caça principalmente à noite e se alimenta de roedores, aves, macacos e até preguiças. Já foi alvo da caça comercial, com exportações de até 80 mil peles por ano no Brasil. Hoje, o principal desafio dos biólogos que a defendem é a destruição do habitat.
Gato-mourisco (Herpailurus yagouaroundi)
Espécie também é chamada de jaguarundi (Herpailurus yagouaroundi)
Juan Manuel Carmona / iNaturalist
Um dos felinos mais peculiares do Brasil, o gato-mourisco tem corpo alongado, cabeça achatada e pelagem cuja cor pode variar bastante. “É um dos poucos felinos que apresenta variação de cor não relacionada ao melanismo, possuindo mais de 10 variações de cor, que vão desde tons de preto ao avermelhado”.
Diferente da maioria dos gatos selvagens, o gato-mourisco é mais ativo durante o dia e pode ser visto com maior facilidade em áreas abertas ou bordas de matas. Habita uma grande variedade de ambientes - de matas densas a áreas mais secas - e sua dieta é composta por pequenos mamíferos, aves e répteis.
Mesmo assim, sua população sofre com perda de habitat e atropelamentos. Embora classificado como "Menos Preocupante" pela IUCN, está como “Vulnerável” no Brasil.
Gato-palheiro (Leopardus braccatus)
Espécie também é conhecida como gato-palheiro-do-pantanal (Leopardus braccatus)
KENNEDY BORGES / iNaturalist
Com pelagem avermelhada ou cinzenta e listras discretas, o gato-palheiro vive principalmente no Cerrado e no Pantanal. É uma das duas espécies reconhecidas no Brasil que faziam parte do antigo grupo Leopardus colocola. Apesar de ser felino, tem hábitos mais diurnos que noturnos.
Pouco estudado, esse gato silvestre alimenta-se de pequenos mamíferos e aves. Vive tanto em campos abertos quanto em áreas florestadas. As principais ameaças são a perda de habitat e o pouco conhecimento sobre sua ecologia. Está classificado como “Quase ameaçado” pela IUCN.
Gato-palheiro-pampeano (Leopardus munoai)
Gato-palheiro-pampeano (Leopardus munoai) depende dos campos nativo do Pampa
Felipe Peters / Felinos do Pampa
Restrito ao bioma Pampa, no sul do Brasil, é considerado o felino mais ameaçado do mundo. Estudos recentes revelaram que ele é uma espécie distinta, e não apenas uma variação do L. braccatus. Sua pelagem tem tons cinzentos ou amarelados com listras oblíquas.
Estima-se que restem menos de 100 indivíduos na natureza. Vive em campos úmidos e pastagens, muitas vezes se escondendo entre a vegetação rasteira. Por esse comportamento, torna-se alvo fácil para atropelamentos e ataques de cães.
“No entanto, a espécie ainda não consta em nenhuma lista oficial de espécies ameaçadas no Brasil, o que evidencia uma preocupante omissão por parte dos órgãos responsáveis pela conservação da fauna”, afirma
Gato-maracajá (Leopardus wiedii)
Gato-maracajá (Leopardus wiedii)
svaldvard / iNaturalist
Este pequeno felino se destaca por sua habilidade arbórea. Consegue girar os tornozelos a 180º e descer de cabeça para baixo das árvores, feito raro entre os felinos. Apesar disso, vive majoritariamente no solo e é encontrado do México até o sul do Brasil.
Com grandes olhos e pelagem similar à da jaguatirica, é ativo à noite e caça roedores e aves, especialmente os que vivem nas copas. Vive em florestas densas e tem densidade populacional associada à cobertura vegetal. Está ameaçado pela perda de habitat e pela caça em retaliação por ataques a galinhas. É considerado “Vulnerável” no Brasil.
Gato-do-mato (Leopardus geoffroyi)
Gato-do-mato-grande (Leopardus geoffroyi)
gabriel_delasala / iNaturalist
Encontrado apenas no sul do Brasil, especialmente no Rio Grande do Sul, o gato-do-mato vive em áreas abertas ou com vegetação arbustiva. Sua pelagem tem coloração variável, do cinza ao ocre, com manchas negras. Os machos são significativamente maiores que as fêmeas.
Possui hábitos noturnos e alimenta-se de pequenos mamíferos, aves, répteis e até peixes. Há registros de indivíduos melânicos, e fêmeas podem ter ninhadas com filhotes de colorações diferentes. Ameaçado por atropelamentos, caça e hibridização com L. guttulus, está classificado como “Vulnerável” no Brasil.
Gato-do-mato-do-sul (Leopardus guttulus)
Gato-do-mato-do-sul (Leopardus guttulus)
sitiocotingalodge / iNaturalist
Durante muito tempo foi confundido com o gato-do-mato-pequeno (L. tigrinus), mas estudos genéticos revelaram diferenças claras. Vive na Mata Atlântica, Cerrado e partes do Centro-Oeste. Tem coloração mais escura e pelagem com rosetas maiores.
É uma das espécies mais ameaçadas do país, com elevadas taxas de mortalidade por atropelamento. Apresenta padrão de atividade que pode ser noturno ou catemeral, dependendo do ambiente. Sua presença está cada vez mais restrita a fragmentos florestais, e há raros registros de indivíduos melânicos.
Gato-do-mato-pequeno (Leopardus tigrinus)
Gato-do-mato-pequeno (Leopardus tigrinus)
thomazcallado / iNaturalist
Espécie enigmática e de difícil observação, o gato-do-mato-pequeno já foi agrupado com outras espécies do gênero, mas hoje é reconhecido como distinto. Em 2024, a descoberta de uma nova espécie, Leopardus pardinoides, reforçou a complexidade genética do grupo.
Segundo o Tiger Cats Conservation Initiative, a população do L. tigrinus sofreu declínio de até 70% devido às ações humanas. Vive em florestas e áreas montanhosas, tem hábitos noturnos e caça pequenos vertebrados. Sua conservação é urgente, pois o conhecimento científico sobre a espécie ainda é limitado.