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Justiça manda soltar mulher presa há 11 dias após reconhecimento por foto; Polícia Civil admite erro


Polícia admite 'equívoco' em reconhecimento que levou à prisão de mulher por roubo em farmácia; Defensoria pede liberdade

A Justiça do Rio mandou soltar Rayane Carla Rodrigues de Oliveira, de 22 anos, acusada de participar de um roubo a uma farmácia no Méier, após ser reconhecida pelas vítimas por uma foto de rede social, em caso revelado pelo RJ2.

Também nesta segunda-feira (27), a Polícia Civil do Rio reconheceu que houve um equívoco no reconhecimento que levou à prisão de Rayane.

A informação foi enviada à Justiça e ao Ministério Público, que já tinha se manifestado favorável à revogação da prisão. O caso foi revelado pelo RJ2 na última semana. Rayane está presa desde 16 de outubro.

"Após realizar outras diligências no curso do processo judicial ficou confirmado que houve um equívoco no reconhecimento feito pela vítima. A delegacia, então, enviou as informações à Justiça e ao Ministério Público, a fim de auxiliar na decretação da liberdade dela. Cabe destacar que a Polícia Civil sempre busca a verdade e a justiça, e seguirá investigando o caso a fim de melhor esclarecer os fatos", dizia a nota da Polícia Civil.

Antes de a Polícia Civil admitir o erro, a Defensoria Pública do Rio de Janeiro já havia pedido o relaxamento da prisão de Rayane e o fim da ação penal. O pedido é baseado em uma perícia técnica que concluiu que Rayane não é nenhuma das mulheres que aparecem nas imagens do crime.

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Segundo a Defensoria, o reconhecimento de Rayane foi feito de forma ilegal, apenas por meio de uma fotografia retirada de rede social, apresentada a dois funcionários da farmácia na delegacia de Todos os Santos. O procedimento não seguiu os protocolos legais, como a descrição prévia da suspeita pelas testemunhas.

Em sua decisão, a juíza considerou que Rayane não representa risco à ordem pública nem ao andamento do processo e que medidas alternativas à prisão são suficientes enquanto o caso é apurado.

Peritos analisam vídeo

Uma perícia técnica realizada pela criminalista Denise Rivera concluiu que Rayane não é nenhuma das três mulheres que aparecem nas imagens do assalto.

“A perícia é importantíssima, tanto para incriminar como para inocentar alguém numa investigação. E, nesse caso, é claro, nós podemos perceber que a Rayane não é nenhuma das três mulheres que participaram desse rouba na farmácia”, analisou Rivera.

Foto usada para reconhecer Rayane no inquérito

Reprodução/TV Globo

O laudo foi entregue à Defensoria Pública e embasou o pedido de soltura e de encerramento da ação penal.

O médico legista e perito Nelson Massini também analisou os vídeos e afirmou que “nenhuma delas é a Rayane”, destacando diferenças físicas e a ausência de uma tatuagem que deveria estar visível.

"Eu fiz várias observações: O cabelo, formato do rosto, eu medi até o formato do pé. E a Rayane tem uma tatuagem que nessa foto deveria aparecer e não aparece", explicou Messini.

"Poderia fazer dimensões de crânio, dimensões de estatura, mas dispensa. Acho que é um grave erro cometido", concluiu.

Família de jovem presa por roubo diz que ela é inocente e que reconhecimento foi feito por foto de rede social

Reprodução/TV Globo

Rayane foi presa no dia 16 de outubro, enquanto estava em um restaurante na Urca com o namorado. Ela não tem antecedentes criminais e trabalha com carteira assinada em uma loja de shopping em Del Castilho.

"O procedimento de reconhecimento que foi realizado pela autoridade policial foi um reconhecimento ilegal, na medida em que não respeitou as normas relativas a esse procedimento".

"As duas testemunhas, vítimas, que foram ouvidas, elas não descreveram previamente. Elas foram apresentadas a uma fotografia (...) você vê que não é uma foto que foi retirada da identidade, é uma foto retirada de rede social", disse a subcoordenadora de Defesa Criminal da Defensoria, Rafaela Garcez.

O Ministério Público, que havia pedido a prisão preventiva de Rayane, também se manifestou nesta segunda-feira (27) favorável à revogação da prisão, considerando os argumentos da defesa e a ausência de laudo pericial nos autos que comprove a autoria. O MP ressaltou que o reconhecimento feito na delegacia precisa ser confirmado em juízo.

Desde outubro de 2023, uma lei estadual determina que pedidos de prisão só podem ser feitos com indícios de autoria e materialidade, e não apenas com base em reconhecimento por foto — entendimento também respaldado pelo Conselho Nacional de Justiça e pelo Superior Tribunal de Justiça.

O processo

Além de Rayane, um homem também foi preso. O inquérito, feito pela 26ª DP (Todos os Santos), afirma que conseguiu identificar membros da organização criminosa que pratica roubos e furtos em várias farmácias da região. Entre eles, Rayane.

Ao apresentar a denúncia, o Ministério Público afirma que foi feito o reconhecimento fotográfico em delegacia policial, com exibição de um mosaico de imagens retratando os denunciados e outras pessoas com semelhanças físicas, tendo as vítimas reconhecido os denunciados.

O outro preso de fato tem antecedentes criminais, inclusive por roubo. Mas Rayane nunca teve nenhuma passagem pela polícia. Não há, no processo, outro elemento de prova que ligue Rayane ao crime.

Família de jovem presa por roubo diz que ela é inocente e que reconhecimento foi feito por foto de rede social

Reprodução/TV Globo

Câmeras de segurança da farmácia registraram o assalto, à 1h42 da madrugada do dia 23 de maio.

Enquanto um homem rende o atendente com uma arma, três mulheres caminham pelos corredores, enchendo sacolas com o que encontram nas estantes. Segundo a polícia, foram levados cerca de R$ 100 mil em produtos, entre medicamentos e itens de beleza.

O registro de ocorrência foi feito por uma funcionária do estabelecimento. A mesma funcionária retornou três meses depois para fazer o reconhecimento dos assaltantes, por meio de fotos em um álbum de suspeitos. No mês seguinte, outro funcionário prestou depoimento e também reconheceu Rayane.

Poucos dias depois, a delegacia concluiu o inquérito, dizendo que "o belo trabalho de investigação da unidade, com a ajuda preliminar da gerência da drogaria, conseguiu identificar alguns membros da organização criminosa que pratica roubos e furtos em farmácias da região".

O delegado, então, representou pela prisão preventiva de Rayane e de um homem. Nove dias depois, o Ministério Público apresentou a denúncia, a partir de informações do inquérito, também solicitando a prisão.

Cinco dias depois, a juíza da 35ª Vara Criminal do Rio aceitou a denúncia e decretou a prisão. No dia seguinte, o mandado foi expedido e, um dia depois, Rayane foi presa.

Pelo que consta no processo, nem a polícia e nem o Ministério público individualizaram a conduta das outras duas que aparecem no vídeo e também não foi feita perícia das imagens.

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