Suspensão de medicação de alto custo preocupa famílias que têm filhos com distrofia rara
Kleber e Andresa Vênancio se mudaram de São Paulo para Campinas para que o filho Juan pudesse tratar a distrofia muscular de Duchenne — doença rara que causa degeneração dos músculos. O menino de 7 anos foi internado no fim de julho no Hospital de Clínicas da Unicamp, mas foi impedido de receber o medicamento Elevidys, devido à recente suspensão temporária do remédio pela Anvisa no país.
"Meu filho está aqui, perdendo músculo. Ele tem que fazer essa infusão o mais rápido possível. A gente não tem tempo, eu tô lutando contra o tempo", disse a mãe.
Juan está com a imunidade reduzida. Ele começou o tratamento nos Estados Unidos e veio para Campinas para dar continuidade. Agora, a família aguarda, com temor, a liberação da Anvisa.
"Eu espero que alguém faça alguma coisa, seja a Anvisa, o Ministério, quem for. Eu preciso que alguém tome providência", apela Andresa.
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O remédio foi suspenso preventivamente no Brasil no último dia 24 de julho pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), após três mortes serem registradas nos Estados Unidos. O preço do produto chega a custar R$ 20 milhões.
O coordenador da área de doenças neuromusculares do Hospital de Clínicas da Unicamp, Marcondes França, diz que é necessário ter segurança científica para o uso de uma substância desenvolvida há pouco tempo.
"A gente é apenas um centro que faz as aplicações. A gente espera que essa evolução caminhe para um bom término e que a gente possa, quem sabe, retomar as aplicações dos pacientes que estavam planejados", relata o coordenador.
Além de Andresa, Mônica Venâncio também está preocupada com a saúde do seu filho. Victor Hugo, de Americana, foi diagnosticado com a doença quando tinha três anos. Ele consegue realizar as atividades que gosta e ir à escola mas, segundo sua mãe Mônica, a doença tem afetado silenciosamente toda a família.
"A gente percebe a dificuldade dele de subir a calçada, subir e descer escada, correr. Ele não consegue participar de brincadeiras de futebol com os amigos, porque ele não corre o suficiente. Essas pequenas dificuldades pra gente são muito perceptíveis", conta a mãe.
Mônica conseguiu na Justiça o fornecimento do remédio milionário pelo SUS, mas ainda não viu o filho ser medicado.
"Não é a cura, mas é um medicamento que vai fazer com que ele possa andar e fazer as atividades normais por mais cinco ou sete anos. Então, pra gente, é uma esperança", relata Mônica.
Nesta quinta-feira (7), a Anvisa publicou uma atualização sobre a suspensão do medicamento e informou que a suspensão temporária do uso do Elevidys não se aplica às remessas previamente autorizadas e importadas para uso clínico em pacientes já individualizados no Brasil.
A EPTV, afiliada da TV Globo, pediu à Anvisa um posicionamento com relação ao tratamento das crianças da região de Campinas e, até a publicação desta reportagem, não teve retorno.
Suspensão preventiva
A decisão da suspensão foi tomada após o FDA (agência reguladora de medicamentos nos Estados Unidos), equivalente à Anvisa no Brasil, divulgar dados de três pessoas que morreram com insuficiência hepática aguda associada ao uso de terapias genéticas baseadas na tecnologia do medicamento.
A Anvisa pediu a suspensão voluntária da distribuição do produto enquanto investiga se há problemas com segurança do produto, como medida preventiva. O órgão informou que aguarda a Roche Farma Brasil, responsável pela comercialização do produto no país, apresentar o "dossiê completo com todos os dados clínicos e científicos disponíveis sobre as investigações em andamento".
No último dia 28, quatro dias após a suspensão no Brasil, a FDA descartou a relação dos óbitos com o medicamento e voltou a recomendar o uso do remédio nos Estados Unidos para pacientes deambuladores — que conseguem caminhar por conta própria —, perfil semelhante ao aprovado pela Anvisa no Brasil. No entanto, a suspensão do tratamento segue válida para pacientes não deambuladores, grupo que ainda está sob investigação.
Posicionamento da farmacêutica
A farmacêutica Roche informou que segue em diálogo com o órgão regulador e demais entidades competentes para garantir que todas as decisões estejam alinhadas com a segurança do paciente e com as diretrizes regulatórias vigentes.
A empresa também reforçou que está trabalhando para providenciar as informações solicitadas pela agência e que compreende o profundo impacto que essa decisão causa na comunidade de distrofia muscular de Duchenne, especialmente nas famílias que aguardam com altas expectativas por essa terapia.
O medicamento
Segundo a Anvisa, o registro do Elevidys no Brasil foi concedido à Roche Farma Brasil em dezembro de 2024, em caráter excepcional exclusivamente para pacientes pediátricos na faixa etária de 4 a 7 anos com distrofia muscular Duchenne — doença rara e progressiva que causa degeneração dos músculos —, e que conseguem andar.
O medicamento começou a ser receitado por médicos nos últimos meses e muitas famílias entraram na Justiça para conseguir acesso ao tratamento.
Juan de 7 anos aguarda liberação do medicamento pela Anvisa
EPTV/Reprodução
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