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Governo revoga duas medidas no pacote de aumento do IOF horas depois de avaliar a reação ruim do mercado


A equipe econômica revogou o aumento do IOF sobre os investimentos de fundos brasileiros em ativos no exterior e as remessas destinadas a investimentos. O governo revogou duas medidas do pacote que aumenta o IOF seis horas depois de tê-lo anunciado. E o motivo disso foi a reação negativa do mercado.

O descompasso do governo começou no início da tarde de quinta-feira (22), quando o ministro dos Transportes, Renan Filho, antecipou, em um evento da B3, a Bolsa de Valores de São Paulo, que a equipe econômica aumentaria o imposto sobre operações financeiras, o IOF.

"O governo vai anunciar hoje à tarde duas medidas: uma no sentido de conter despesas. E vai, ao mesmo tempo, anunciar um incremento de IOF”, disse o ministro dos Transportes Renan Filho.

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Uma hora depois, durante a entrevista coletiva para anunciar os cortes no Orçamento, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, demonstrou irritação com o vazamento das medidas:

"Aqui não vaza nada, pode ter certeza. Quando a gente trata de assunto da Fazenda, tem questão de protocolo interno na Fazenda e no Planejamento”, disse.

Haddad se recusou a detalhar as mudanças no IOF. Disse que os técnicos do ministério iriam explicar as medidas dali a uma hora e meia. Mas afirmou que todas elas receberam o aval do presidente Lula.

Assim que o ministro da Fazenda se levantou para ir embora, a ministra do Planejamento, Simone Tebet, orientou o secretários, em uma conversa de pé de ouvido, a não dar informações antecipadas sobre o IOF:

"Eles querem o detalhamento do IOF antes de fechar o mercado”.

Depois das 17h, com o fechamento da Bolsa, a equipe econômica começou a explicar as mudanças. O secretário da Receita, Robinson Barreirinhas, defendeu a cobrança de IOF sobre a transferência de fundos brasileiros para investimentos no exterior:

"Nós temos também uma situação hoje que nos parece inadequada de incentivo de investimento no exterior”, disse.

A medida repercutiu muito mal. Integrantes da equipe econômica receberam telefonemas de integrantes do mercado alertando para o risco de os investidores interpretarem a medida como o início do controle sobre os investimentos que entram e saem do Brasil.

A equipe econômica discutiu as consequências da medida em uma reunião de última hora. O assunto também foi discutido também em uma reunião de rotina, já previamente marcada, no Palácio do Planalto, entre o ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, o ministro da Secretaria de Comunicação, Sidônio Palmeira, e a ministra da Articulação Política, Gleisi Hoffmann. Durante a reunião, Sidônio e Haddad se falaram por telefone e decidiram agir rapidamente.

Passava das 23h quando o Ministério da Fazenda divulgou a revogação em uma rede social.

Jornal Nacional/ Reprodução

Naquele momento, a equipe econômica já havia decidido revogar o aumento do IOF sobre os investimentos de fundos brasileiros em ativos no exterior e as remessas destinadas a investimentos. Passava das 23h quando o Ministério da Fazenda divulgou a revogação em uma rede social.

Nesta sexta-feira (23) pela manhã, Haddad convocou uma entrevista coletiva para explicar o recuo. Disse que o governo vai deixar de arrecadar menos de R$ 2 bilhões dos R$ 20 bilhões previstos com o aumento do IOF.

"Esse item é um item muito residual desse acervo, desse conjunto de medidas, e nós entendemos que, pelas informações recebidas, valia a pena fazer uma revisão desse item para evitar especulações sobre objetivos que não são próprios da Fazenda, nem do governo, de inibir investimento fora. Não tinha nada a ver com isso. Então, nós entendemos que era correto fazer uma revisão disso”, disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Governo revoga duas medidas no pacote de aumento do IOF horas depois de avaliar a reação ruim do mercado

Jornal Nacional/ Reprodução

À TV Globo, o ministro disse que não houve interferência política no recuo do governo. Economistas ouvidos pelo Jornal Nacional afirmaram que o recuo foi a única medida possível, porque o governo estava passando a mensagem de que poderia controlar a saída do dinheiro investido no país.

"Essa percepção é muito ruim. Porque essa percepção está dizendo o seguinte: governo está indo na direção de dificultar muito o direito que as pessoas têm de movimentar livremente sua riqueza financeira. Isso gera um monte de incertezas, pode antecipar movimentos e gerar impactos muito grandes sobre cotação do câmbio, taxas de juros e, portanto, sobre a atividade econômica e inflação”, afirma Samuel Pessôa, pesquisador associado do FGV-Ibre.

"O Brasil, como todos os países, precisa de investimentos. Com os investimentos que nós temos localmente, a gente não consegue crescer muito. Nós precisamos, complementarmente, de investimento externo. Leva a gente na direção oposta de quem quer receber investimentos e se tornar um país que tem uma visão mais global do mundo, que está mais aberto para o mundo”, diz Luiz Fernando Figueiredo, ex-diretor do Banco Central.

À tarde, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, defendeu Haddad:

"Todo mundo aqui precisa louvar e reconhecer que o ministro, como bom democrata que é, em poucas horas após o anúncio da medida, ela já estava suprimida ali. E antes mesmo do mercado abrir, já tinha ouvido a sociedade, ouvido os agentes, e sempre muito disposto a fazer isso”.

Galípolo também disse que não era favorável à ideia de usar o IOF como instrumento para aumentar a arrecadação e cumprir a meta fiscal:

"Em debates anteriores, um tempo atrás, em qualquer momento que se discutia a alternativa do IOF como alternativa para perseguição da meta, eu, pessoalmente - para usar um eufemismo - nunca tive muita simpatia sobre a ideia. Para não dizer que não tenho mesmo. Não acho, não gostava da ideia”.

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