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Pacientes se revoltam com demora na emergência e na espera de cirurgias em Sorocaba: 'Não é um prontuário, é uma vida'


Problemas foram relatados na terça-feira (10) nos telejornais da TV TEM. Prefeitura diz que a rede está empenhada em garantir o atendimento e reforça a contínua melhoria da rede de saúde municipal. Pacientes reclamam da demora nos atendimentos nos hospitais públicos de Sorocaba

A demora no atendimento nas unidades de emergência e a falta de informações e transparência sobre como está a fila de espera para cirurgias estão causando sofrimento, angústia e revolta em usuários do sistema de saúde pública de Sorocaba (SP).

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Os problemas foram relatados na terça-feira (10) nos telejornais da TV TEM. A falta de dignidade pesa no ponteiro do relógio e arrasta a angústia de muitas famílias, que lutam por uma vaga no sistema público de saúde.

População reclama de problemas na saúde pública de Sorocaba

Reprodução/TV TEM

A empresária Tânia Gonçalves viveu a inquietação da espera enquanto buscava um leito para o marido, que tem câncer e é cardíaco. Durante cinco dias, ele ficou internado na Unidade Pré-Hospitalar da zona oeste para tratar uma hemorragia grave na bexiga.

A vaga de transferência para o Conjunto Hospitalar saiu na segunda-feira (9), dez minutos antes de ela iniciar a entrevista. "Não é fácil você ver uma pessoa sua, querida, estar ali em uma situação sofrendo e ninguém faz nada. É um descaso", comenta Tânia.

A vaga foi liberada pela Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (Cross). Tânia foi informada que, mesmo diante de todo o sofrimento, o nome do marido só havia sido inserido na fila poucos dias antes.

Empresária buscou atendimento para o marido e reclama da demora em Sorocaba (SP)

Reprodução/TV TEM

Já Alessandra Ferraz, estudante, e Angela Ferras de Oliveira se agarram às lembranças de uma saudade de três letras: mãe. O maior amor do mundo delas partiu deixando um espaço tão grande quanto.

"Minha mãe foi sempre para nós uma grande rede de apoio. Ela está fazendo muita falta. Você perdeu a sua mãe para a irresponsabilidade de terceiros", lamenta Alessandra.

Há cinco anos, a mãe delas entrou na fila para uma cirurgia no joelho. Queria ir à feira, passear com os filhos. O último lugar que visitou, acompanhada deles, foi a UPH da zona norte, onde morreu.

As filhas tentaram vaga durante vários dias para hospitais mais equipados. A ligação da prefeitura chegou quando a mãe delas já não estava mais viva. "É revoltante. Nada faz sentido", desabafa Alessandra.

Outra paciente, que pediu para não ser identificada, também sofreu com a espera por uma vaga e ainda sofre, nos dias atuais, quando lembra da irmã Maria de Fátima, que morreu por complicações de uma pneumonia.

Irmãs reclamam da saúde de Sorocaba (SP) após morte da mãe

Reprodução/TV TEM

A vítima passou por atendimento em Manduri (SP) e, quando voltou para Sorocaba, também procurou ajuda. "Não dá para entender", reclama.

Foi no Pronto Atendimento do Laranjeiras, na zona norte de Sorocaba, que Maria recebeu o primeiro atendimento. Ela recebeu medicamentos e foi liberada.

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Segundo o Observatório da Saúde, mais de 1,5 milhão das internações do Sistema Único de Saúde (SUS) em 2024 estavam relacionadas com doenças já diagnosticadas, mas que foram negligenciadas pela atenção primária à saúde. Isto é, pacientes que morreram porque todos os cuidados iniciais não foram feitos.

Choro e revolta na UPH

Valdisneia de Oliveira reclama do atendimento para o filho em unidade de saúde de Sorocaba (SP)

Reprodução/TV TEM

O choro de Valdisneia de Oliveira é de desespero. O filho dela estava na UPH da zona norte na terça-feira havia horas, à espera de transferência para um hospital. O jovem, de 25 anos, passou a noite em uma cadeira e, horas depois, foi colocado em uma poltrona, pois nem leito havia para acomodar o paciente na unidade.

"Ele é um garoto especial. Vem tendo crises desde domingo (8), às 16h. Mandaram a gente para casa, e ontem [segunda-feira (9)], às 21h, mandaram a gente para cá. Eu vim com ele e só consegui levar ele para dentro porque ele apagou. No caos, na correria de uma emergência foi que eu consegui uma cadeira para ele."

Na porta da UPH da zona norte, Lúcia Nunes Albertini vivia a mesma angústia. Ela acompanhava o pai, um senhor de 71 anos, que também esperava horas e horas por uma transferência.

"Minhas irmãs levaram meu pai no PA das Laranjeiras e ele foi transferido para cá 3h. Desde então, ele está aguardando um leito, uma vaga. Ele é um idos de 71 anos, tem uma doença autoimune: vasculite. Meu pai está quase com o rim parando. Meu pai não é um prontuário, ele é uma vida”, diz.

"Está em uma cadeira, esperando vaga, esperando uma ambulância, nem um leito, nada. Fala que tem que aguardar leito, que não tem leito", lembra.

Desde 2023, o número de leitos de UTI na rede municipal de saúde de Sorocaba é o mesmo: 57, sendo que 50 deles estão na Santa Casa. Na rede estadual, são 349 leitos para atender pacientes que chegam de 48 municípios.

A Secretaria Estadual de Saúde assume que está operando no limite da capacidade. A causa seria o aumento de internações por síndromes respiratórias. Sem leitos para uma melhor recuperação, pacientes esperam em macas improvisadas e parentes imploram por um atendimento digno.

Mais de 15 mil na fila

O último balanço divulgado pela prefeitura, em março de 2024, mostra que, somente para uma consulta com reumatologista, são 2,6 mil pessoas na fila de espera.

E não é somente para essa especialidade que há fila. Segundo o mesmo balanço, são pelo menos 15,2 mil pessoas aguardando por consultas, exames ou cirurgias em várias especialidades médicas.

A autônoma Elizangela Pereira Neves é uma das pessoas que estão na fila. Ela aguarda há sete anos por uma cirurgia na hérnia. "Tenho muita dificuldade, até de dormir", conta. A situação fica cada vez mais complicada, pois até para assistir televisão ela precisa de cadeira. "Eles falam que tem que aguardar a cirurgia, mas a cirurgia não sai."

Elizangela Pereira Neves aguarda há sete anos por cirurgia em Sorocaba (SP)

Reprodução/TV TEM

Em abril, um projeto de lei foi aprovado por unanimidade pela Câmara de Vereadores de Sorocaba. O documento exigia que a prefeitura informasse a quantidade de pacientes que aguarda atendimento com especialistas.

A lei ainda determinava que os pacientes saberiam, por um sistema informatizado, a posição de cada um deles na fila de espera. Mas o prefeito Rodrigo Manga (Republicanos) vetou o projeto. Por lei, os vereadores podem derrubar o veto. No dia 17 de junho, eles voltam a discutir o assunto e decidem se as justificativas para o veto são válidas ou não.

Entre elas, o Executivo afirma que não pode informar a posição dos pacientes na fila por um sistema informatizado por se tratarem de informações integradas entre o município e o estado.

Segundo o diretor do Departamento Regional de Saúde de Sorocaba (DRS), Carlos Eduardo Ribeiro de Moura, as filas do estado e do município são diferentes.

Enquanto isso, a esperança dos pacientes era que a construção de um hospital municipal, promessa de campanha do prefeito Rodrigo Manga, pudesse agilizar atendimentos e acelerar essa fila.

Mas a unidade ainda não saiu do papel. Segundo a prefeitura, o complexo de saúde, que terá uma central municipal de diagnósticos, ficará pronto em fevereiro de 2026. A previsão é que custe aos cofres públicos R$ 470 milhões.

O que dizem estado e prefeitura

A Secretaria da Saúde (SES) de Sorocaba afirmou que lamenta profundamente os falecimentos noticiados e se solidariza com os familiares das pacientes. Disse ainda que todas as situações relatadas serão devidamente apuradas pelas instâncias competentes, a fim de garantir a transparência dos procedimentos e a contínua melhoria da rede de saúde municipal.

"Com relação ao processo de regulação, esclarece-se que a inclusão de pacientes no Sistema CROSS (Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde), sob gestão do Governo do Estado de São Paulo, depende de critérios clínicos específicos, definidos por protocolo estadual. A avaliação médica para definição do tipo de leito necessário (enfermaria ou UTI) e a indicação de inserção no sistema são realizadas por profissionais da rede municipal em conjunto com a equipe de regulação municipal."

Também argumentou que "a rede municipal realiza diariamente esforços para garantir o encaminhamento de todos os pacientes que necessitam de internação, seja em leitos locais, seja por meio da regulação estadual".

"A disponibilidade de leitos depende da taxa de ocupação, que pode variar diariamente conforme o fluxo assistencial e a gravidade dos casos atendidos."

Sobre o atendimento na UPH Norte, disse que já notificou a prestadora de serviço e aguarda o retorno no prazo formal para os esclarecimentos. "A SES salienta que continuará fiscalizando a entidade, a fim de que o melhor atendimento seja prestado à população."

O estado não retornou aos questionamentos da TV TEM.

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