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Em missão na Amazônia, voluntários enfatizam importância do barco-hospital criado a pedido do papa Francisco: 'Um pedacinho dele'


Ideia do projeto, que surgiu do Frei Francisco Belotti, presidente da Associação e Fraternidade São Francisco de Assis na Providência de Deus, de Jaci, no interior de SP, atendeu a um pedido do papa Francisco durante a visita que fez ao Brasil em 2013. Voluntários de barco-hospital relembram importância do papa Francisco para projeto de Jaci

A equipe de profissionais da saúde voluntários do barco-hospital São João XXIII, que foi criado a partir de uma ideia do papa Francisco, e trouxe atendimento para as comunidades ribeirinhas de Novo Remanso, distrito de Itacoatiara (AM), amanheceu de luto com a notícia da morte do pontífice na madrugada de segunda-feira (21) - às 2h35 no horário de Brasília.

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Jorge Mario Bergoglio morreu aos 88 anos, em Roma, conforme informou o Vaticano. O pontífice, aclamado por trazer um sopro de renovação à Igreja Católica, plantou a semente da missão que hoje flutua entre rios e salva vidas de pessoas carentes na região norte do país.

A ideia do projeto, que surgiu do Frei Francisco Belotti, presidente da Associação e Fraternidade São Francisco de Assis na Providência de Deus, de Jaci, no interior de São Paulo, atendeu ao pedido do papa Francisco durante a visita que fez ao Brasil em 2013.

Barco-hospital São João XXIII, criado por associação de Jaci (SP), atende moradores ribeirinhos na Amazônia

Desirèe Assis/g1

Atualmente, 12 anos depois do pedido, são três barcos-hospitais atendendo comunidades ribeirinhas na região norte: João Paulo II, São João XXIII e São Francisco. As expedições são feitas ao mesmo tempo, sendo duas por mês, uma no Pará e outra no Amazonas, oferecendo atendimento médico, de enfermagem e cirurgias.

Neste ano, o g1 e TV TEM, afiliada da TV Globo na região de São José do Rio Preto, no interior de SP, acompanham a sétima expedição do barco São João XXIII, que está no Amazonas, que ocorre de 17 até o dia 25 de abril. Até a manhã desta segunda-feira, o barco fez 1.183 atendimentos médicos e odontológicos, somados.

À TV TEM, o coordenador do barco, Frei Alberto, da ordem franciscana, lembrou que papa Francisco nutriu e ensinou o caminho para chegar até a Amazônia, onde os mais carentes estão não em catedrais, mas em barrancos, palafitas, aldeias e comunidades como Novo Remanso.

“Quando interroga o Frei Francisco: ‘Vocês já estão na Amazônia?’ e ele responde ‘ainda não’, o papa diz: ‘Então, vocês devem ir’. Aqui estamos, cumprindo um pedido da igreja, um pedido do papa Francisco, atendendo essa população que tanto precisa”, salienta o frei.

Barco-hospital São João XXIII homenageia papa Francisco após a divulgação da morte

Desirèe Assis/g1

Em 2018, o Frei Francisco visitou o papa no Vaticano para entregar a ele o convite da inauguração do barco-hospital São Francisco, que ocorreu em 2019, quando começou a navegar.

Na ocasião, o papa gravou um vídeo para a associação e mandou uma saudação para os moradores ribeirinhos e também para os homens que trabalham na construção do barco (assista ao vídeo abaixo).

“Uma saudação de coração a todos habitantes da Amazônia, um carinho muito grande por quem cuida da terra, ama a terra, ama a natureza e ama a Deus. Sigam adiante. Uma saudação aos que trabalham no barco-hospital, que vai fazer tanto bem nesses mil quilômetros ao povo. Rezo por vocês e vocês rezem por mim. Que o senhor os abençoe”, disse o papa na ocasião.

Frei brasileiro entrega convite ao papa Francisco e mostra projeto de barco-hospital

Fé que transforma

Como um reflexo de Francisco, a missão é acessível, corajosa e profundamente humana. Uma das enfermeiras da embarcação, Priscila Brasil da Silva, de 37 anos, devota de São Francisco, se emocionou com a notícia da perda do pontífice.

Ao g1, a profissional explicou que o filho nasceu prematuro, aos sete meses, com dois furos no coração, em Manaus (AM). Por isso, precisou ficar 15 dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

Priscila Brasil, enfermeira do barco-hospital São João XXIII, no distrito de Novo Remanso, em Itacoatiara (AM)

Desirèe Assis/g1

Católica, a mãe de Priscila, Marlene Brasil da Silva, de 60 anos, fez uma promessa ao papa de que, se o primeiro neto se curasse, completaria a procissão de São Francisco de Assis de joelhos e rezaria todas as noites. Dois meses depois, o menino passou por consultas médicas, que constataram: ele estava curado.

“A gente tem essa fé e mesmo que a gente nunca tenha visto [o papa], só por televisão, dá aquele negócio no coração, aquele engasgo na garganta. É verdadeiro. E a fé muda tudo, muda muita coisa”, se emociona Priscila.

Questionada sobre o que o papa representa para ela, Priscila garante: um homem bom, santo, que, em meio às dificuldades, procurou ajudar a todos.

O cirurgião-dentista, que atende pacientes do barco, Maurício Conti, comentou que Francisco foi um construtor de pontes: entre o discurso e a prática, entre os centros e as periferias, entre o altar e a canoa.

Segundo ele, a missão do barco não é apenas um projeto médico. Ao contrário, na visão de Maurício é uma obra viva da fé materializada em serviço, de cuidado que atravessa quilômetros de rios para chegar a quem, de outro modo, morreria esperando uma chance.

“Fomos tomados com essa notícia, da morte do papa Francisco. Papa que tem presença única para este projeto. Papa Francisco dizia que mais do que oração a gente tem que fazer a hora da ação. É isso que estamos fazendo e é a melhor forma que a gente tem de homenagear o papa Francisco”, conclui Maurício.

Maurício Conte em atendimento odontológico no barco-hospital São João XXIII no distrito de Novo Remanso em Itacoatiara (AM)

Desirèe Assis/g1

Enquanto houver uma criança com dor de dente, cárie, sem diagnóstico, com sangramento, a missão não pode parar. É assim que a cirurgiã-dentista Letícia Menegasso descreveu a expedição, diante da dor da perda do papa Francisco.

De acordo com a profissional, o trabalho voluntário não é apenas um pedido do papa. É a resposta dos profissionais de quem entendeu que a fé não se vive nas palavras, mas nas ações.

“A gente fica muito emocionada, pelo legado que ele deixou, as palavras que ele sempre usou, um papa muito humilde. Estar aqui hoje representa muito porque a gente está carregando um pedacinho dele, continuando um trabalho que ele queria que a gente construísse e é muito importante isso”, enfatiza Letícia.

Barco-hospital São João XXIII homenageia papa Francisco após a divulgação da morte

Desirèe Assis/g1

Legado inquestionável

Nesta segunda feira, em entrevista à TV TEM, o Frei Francisco Belotti, de Jaci (SP), relembrou os momentos que viveu ao lado do pontífice e lamentou a morte.

“O momento é de muita emoção porque passam pela minha cabeça todos os momentos das nossas conversas. No primeiro momento, ele pedia para ir para o Amazonas e também se reuniu com os jovens dependentes químicos, dando uma mensagem lindíssima: ‘que ninguém pudesse roubar a esperança de um dia se recuperar’. O segundo momento foi quando eu fui entregar o convite do barco-hospital quase pronto e disse a ele que o barco se chamaria papa Francisco”, relembra.

Papa recebe frei Francisco (à direita) e ganhou convite para lançamento de barco hospital

Divulgação

Ainda segundo o frei, o terceiro e último contato foi quando levou o convite para a inauguração do terceiro barco, São João XXIII, no estado do Amazonas.

“Ele sorria muito e dizia 'vocês são muito corajosos'... Isso fica muito na nossa memória, mas fica também o seu testemunho de vida. De apostolo, de discípulo de Jesus, devotíssimo de São Francisco de Assis”, reforça.

Frei Francisco Belotti da Associação São Francisco de Assis de Jaci (SP)

Reprodução / TV TEM

Para o frei, a vida do papa foi composta de acordo com os princípios da vida franciscana. Hoje, com os barcos em operação, o que fica é o legado deixado pelo pontífice.

“É muito emocionante. Quando o barco chega, as pessoas não dizem assim, o barco-hospital está chegando. Elas dizem, ‘o papa Francisco está chegando’. É a pessoa dele na forma do barco, na memória das pessoas, que foi tão forte”.

Durante esses encontros, Frei Francisco também foi encorajado a seguir os princípios do catolicismo.

“Ele [papa] disse assim: ‘Não mude o caminho’. São recordações que batem no nosso peito com muita emoção e aguardamos a sua canonização”, finaliza Belotti.

Frei de Jaci atende pedido feito pelo papa Francisco para atender famílias ribeirinhas

O bispo da Diocese de São José do Rio Preto, Dom Antonio Emidio Vilar, também comentou sobre a partida do pontífice.

“Nós, como igreja, queremos pedir ao senhor da vida que dê o seu descanso ao nosso querido papa Francisco, que para nós foi realmente muito próximo. Ele, desde o início, mostrou uma simplicidade, uma proximidade, e todo seu pontificado vai ficar marcado profundamente também pela busca da paz, que ontem ele expressou, a busca de entendimento entre as nações e, sobretudo, o cuidado com os mais pobres”, disse.

Bispo da Diocese de São José do Rio Preto (SP), Dom Antonio Emidio Vilar

Reprodução / TV TEM

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